Gaspar Correia, Lendas da Índia, Academia das Ciências de Lisboa, Lisboa, 1858-1864
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Gaspar Correia, Lendas da Índia, sob a direcção de Rodrigo José de Lima Felner, Academia das Ciências de Lisboa, Lisboa, 1858-1864
Primeira edição. Completo. Encadernação coeva.
«Liv. 1, t. 1: Contendo as acções de Vasco da Gama, Pedraluares Cabral, João da Nova, Francisco de Alboquerque, Vicente Sodré, Duarte Pacheco, Lopo Soares, Manuel Telles, D. Francisco d' Almeida, Lenda de 13 annos, desde o primeiro descobrimento da India até o anno de 1510. - 1858. - XXX, 492 p. . - Liv. 1, t. 1, pt. 2: 1859. - p. 493-1013 . - Liv. 2, t. 2 : Em que se recontão os famosos feitos d' Afonso d' Albuquerque, Lopo Soares, Diogo Lopes de Sequeira, D. Duarte de Menezes, D. Vasco da Gama Visorey, D. Anrique de Menezes. - 1860. - 482 p. . - Liv. 2, t. 2, pt. 2. - 1961. - p. 483-985 . - Liv. 3, t. 3: Que conta dos feitos de Pero Mascarenhas, e Lopo Vaz de Sampayo, e Nuno da Cunha. - 1862. - 438 p. . - Liv. 3, t. 3, pt. 2 : 1863. - p. 439-909 . - Liv. 4, t. 4 : A quarta parte da cronica dos feytos que se passarão na India do ano de 1538 até ao ano de 1550, em que residirão seis governadores. (D. Gracia de Noronha, D. Estevão da Gama, Martim Afonso de Sousa, D. João de Crasto, Gracia de Sá, e Jorge Cabral). - 1864. - 472 p., [4] p. il. . - Liv. 4, t. 4, pt. 2 : 1866. - p. 473-756, 98 p.»
Gaspar Correia (1492 — c. 1561) foi um historiador português, autor das Lendas da Índia, uma das mais importantes obras sobre a primeira fase da presença portuguesa na Índia e no Oriente. É referido como o Políbio português. A sua obra mais importante, Lendas da Índia, só teve edição em meados do século XIX, a presente edição.
São escassas as informações sobre a sua vida, assim como são poucas as informações que dispomos sobre a suas origens familiares. Apesar da escassez de fontes, António Banha de Andrade situa o seu nascimento em 1492, atribuindo a paternidade a Aires Botelho, comendador de São Martinho das Feixedas, no bispado de Viseu.
Pertenceu à Real Câmara, fazendo as primeiras armas no Ultramar, e foi escrivão do governador na Índia, para onde emigrou no transe da euforia albuquerquiana. Viveu então a aventura das armas e das letras, relatando as suas experiências como secretário de Afonso de Albuquerque, o conquistador de Goa e Malaca, com detalhe minucioso. A presente obra, Lendas da Índia, é talvez o mais vigoroso monumento literário da presença portuguesa no Oriente. A sua historiografia é direta, nutrida da própria heroica atualidade. Através da sua leitura, descobrimos vivências autênticas do autor que resultam numa sobriedade e realismo, que se alia ao cuidado informativo e minúcia descritiva de um exótico extremamente rico e de cenas picarescas. O autor não se prendeu ao que não fosse o "drama" humano, o "processo" épico. Este livro de viagens adotou este título pelo carácter de registo que possui, podendo o vocábulo "lenda" significar "livro de bordo" ou "registo".
A sua obra "Lendas da Índia", embora escrita num estilo pouco formal, é considerada uma importante fonte coeva, sendo fruto da memória de 35 anos na Índia, privando de fontes desconhecidas para contemporâneos como Castanheda ou João de Barros. A obra é ilustrada com os retratos dos governadores e plantas e desenhos panorâmicos de algumas fortalezas, de excepcional interesse para o estudo da fortaleza de transição. Deve-se a ele a primeira descrição europeia de cólera asiática. Alguns autores afirmam que foi assassinado em Malaca, por ordem do governador Estevão da Gama, neto de Vasco da Gama.
Embora alguns autores acreditem que existiu uma edição dessa obra em 1556, é mais provável que cópias do manuscrito desse compêndio de 3500 páginas tenham circulado entre alguns poucos escolhidos, após ter sido trazido da Índia para Portugal por Miguel da Gama, pouco depois da morte do autor.
A família conservou o manuscrito original das "Lendas da Índia", que apenas viria a ser impresso, pela primeira vez, entre 1858 (início da primeira parte) e 1863 (final da segunda parte) por disposição da Academia Real das Ciências de Lisboa.
Dele e desta obra refere Inocêncio da silva no seu dicionário bibliográfico:
«Gaspar Corrêa, cuja naturalidade e nascimento se ignoram; sabendo-se apenas que partíra de Portugal para a India em verdes annos, no de 1512: que lá militára durante alguns, voltando depois para o reino, onde com certeza consta que se achava em 1529. Regressou ao Oriente em segunda viagem, e ahi entre os perigos da guerra e os encargos do serviço publico achou vagar e meios de traçar e compôr uma circumstanciada e interessantissima historia da India, e da sua conquista, que comprehende o periodo de cincoenta e tres annos a contar do descobrimento. Emprehendeu trabalhosas e successivas excursões nos diversos pontos sujeitos então ao dominio portuguez, para colher de primeira mão as informações e noticias de que carecia, e verificar por si a exactidão dos factos, as situações locaes, e tudo o que lhe era indispensavel para que a sua narrativa (embora escripta com estylo proprio de soldado que não cursou as aulas) tivesse ao menos o cunho de fiel, imparcial e verdadeira. Vê-se que ainda no anno de 1561 se occupava de pulir e retocar a sua obra; Presume-se porém que falecêra em Goa pouco tempo depois, sem que o tivesse para dar a este trabalho a ultima lima.
Depois de permanecer inedita por mais de tres seculos, a Academia Real das Sciencias, que já antes do anno de 1790 intentára fazer a expensas suas a publicação d'esta obra, resolveu ha pouco realisar esse intento, e que por ella principiasse a Collecção de monumentos ineditos para a Historia das conquistas dos portuguezes em Africa, Asia e America, applicando para isso uma parte do subsidio que o governo lhe conferíra, destinado originariamente á continuação do Quadro elementar das Relações diplomaticas, etc., a cargo do falecido Visconde de Santarem.
Foi pela segunda classe da Academia incumbida a direcção d'este trabalho ao socio effectivo da mesma classe o sr. Rodrigo Felner, que correspondendo á confiança n'elle depositada, prosegue com zêlo e diligencia no desempenho da sua commissão, achando-se já publicado e completo o primeiro tomo.
Não apparecendo o original d'este volume, que com bons fundamentos se julga perdido, foi mister supprir a falta d'elle, fazendo-se a edição por uma cópia assás correcta, que por fortuna existia no Archivo Nacional, conferida porém prévia e escrupulosamente com duas outras, achadas uma na Bibliotheca Real d'Ajuda, e outra na propria Academia das Sciencias. Para os tres volumes que faltam, existem felizmente no referido Archivo os proprios autographos de Correa, alli recolhidos no tempo em que serviu de guarda-mór o sr. dr. Nunes de Carvalho.
Eis-aqui a descripção da parte já publicada:
58) Lendas da India, por Gaspar Correa, publicadas de ordem da Classe de Sciencias moraes, politicas e bellas letras da Academia Real das Sciencias de Lisboa, e sob a direcção de Rodrigo José de Lima Felner, socio efectivo da mesma Academia. Obra subsidiada pelo Governo de Portugal. Livro primeiro. Contendo as acções de Vasco da Gama, Pedralvares Cabral, João da Nova Francisco de Albuquerque, Vicente Sodré, Duarte Pacheco Lopo Soares Manuel Telles, D. Francisco d'Almeida. Lenda de treze annos, desde o primeiro descobrimento da India até o anno de 1510. Tomo I. Lisboa, na Typ. da Academia R. das Sciencias 1858. 4.º gr. de xxx492 pag. Serve de apparato a noticia preliminar de pag. V a XXX, em que se contém o pouco que hoje é possivel saber com evidencia acerca do auctor da obra, e se dá minuciosa razão de todo o concernente a esta, e a sua publicação.
Lendas da India, etc. Tomo I. Parte II. Ibi, na mesma Typ. 1859. 4.º gr. Prosegue a numeração sobre a da parte I, de pag. 493 até 1009, em que termina o indice dos capitulos. Segue-se a tabella de erratas, que occupa de pag. 1011 a 1013.
No Suplemento final darei conta do estado a que por esse tempo houver chegado a continuação da obra, e do mais que a seu respeito occorrer.»
(…)
Eis-aqui a resenha completa dos quatro volumes em que ficaram na impressão divididas as Lendas da India, cujo titulo dei sob n.º 58; a saber:
Tomo I. Lenda de treze annos, desde o primeiro descobrimento da India até o anno de 1510. Parte.ª 1.ª Lisboa, Typ. da Academia Real das Sciencias 1858. 4.º gr. Contem XXX-492 pag. - Parte 2.ª Ibi, 1859. De pag. 493 a 1013, sendo as tres ultimas de errata.
Tomo II. Lenda de dezesepte annos acabados no de 1526. Parte 1.ª Ibi, 1860. De pag. 1 a 482. - Parte 2.ª Ibi, 1861. De pag. 483 a 985, com uma de errata. É acompanhado este volume de dez estampas lithographadas, com retratos dos vice-reis e governadores, e vistas de algumas cidades e fortalezas, etc.
Tomo III. Lenda do que se passou no espaço de dezesepte annos (que findam em 1537?). Parte l.ª Ibi, 1862. De pag. 1 a 438. - Parte 2.ª Ibi, 1863. De pag. 439 a 908 e uma de errata. Com septe estampas.
Tomo IV. Em que se comprehendem os feitos dos annos de 1538 a 1550. Parte 1.ª Ibi, 1864. De pag. 1 a 472. - Parte 2.ª Ibi, 1866. De pag. 473 a 756, seguindo-se 98 pag. de indice dos nomes historicos e geographicos, etc., e uma de errata. Com seis estampas.
Falta ainda para concluir a obra a publicação das notas e glossario promettidos, e que devem annexar-se ao ultimo volume.
Ao sr. Rodrigo Felner, encarregado de dirigir a publicação foi de principio arbitrada pela Academia em remuneração d'esse trabalho a gratifcação annual de 480$000 réis, elevada depois a 600$000 réis, dando-se-lhe para coadjuval-o o habil paleographo, o sr. José Gomes de Goes, hoje Socio correspondente da mesma Academia. A execução do mesmo trabalho mereceu ao director os louvores do Governo em portarias muito honrosas, das quaes uma póde ler-se no Diario de Lisboa de 3 de Março de 1862. Tambem lhe foi em atenção a este serviço conferido o grau de Official da Ordem de S. Tiago. (Diario de 4 de Julho de 1866) mercê de que desistiu, sendo-lhe acceite a renuncia em 4 de Fevereiro de 1867.
Quanto ás obras publicadas em seguida ás Lendas, vej. no Supplemento o artigo Subsidios para a historia da India portugueza. Ahi mesmo acharão talvez logar outros esclarecimentos, que por apertos do tempo tenho de preterir n'esta occasião.»
In: Diccionário bibliographico portuguez: estudos de Innocêncio Francisco da Silva aplicáveis a Portugal e ao Brazil; Imprensa Nacional, 1858, (t. iii-126 e t. ix-413);