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Livros invulgares Literatura portuguesa

Eça de Queirós, O crime do padre Amaro, Tipografia Castro Irmão, Lisboa, 1876

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Descrição cmpleta:

Eça de Queirós, O crime do padre Amaro, edição definitiva. Lisboa. Tipografia Castro Irmão, 31, Rua da Cruz de Pau, 1876

viii-362 pp.; 21 cm.

Rara e muito procurada primeira edição em livro.

Mantém a capa e a contra-capa de brochura originais.

Encadernação meia francesa com cantos em pele.

 

A impressão desta edição foi custeada pelo pai do Eça, José Maria de Almeida Teixeira de Queiroz, que se responsabilizou por quaisquer prejuízos que o livreiro-editor Ernesto Chardron pudesse ter. Chardron comprou a totalidade dos exemplares para os revender: «Procure promover a saída do livro, e se o meu filho lhe escrever para saber como vai a venda, não o desanime, pois ele tem ‘geiteira’ para as letras: de resto eu tomo a responsabilidade por qualquer prejuízo que o seu insucesso ocasione» OEQV, Vol. I, p. 285. A tiragem foi de somente 800 exemplares, vendeu-se mal. Foram colocados no mercado 750, todavia em abril de 1878 ainda restavam bastantes exemplares na “Livraria Internacional”. Em 1914, esta edição já era considerada «muito rara» pelos bibliófilos, vide o Catálogo da Biblioteca Rodrigo Veloso, Porto, 1914.

«A designação inscrita no frontispício deste livro — Edição Definitiva —necessita de uma explicação. O crime do Padre Amaro foi escrito há quatro ou cinco anos, e desde essa época esteve esquecido entre os meus papéis — como um esboço de romance e pouco aproveitável. Por circunstâncias que não são bastante interessantes para serem impressas — este esboço de romance, em que a acção, os caracteres, e o estilo eram uma improvisação desleixada, foi publicada em 1875 nos primeiros fascículos da Revista Ocidental, sem alterações, sem correções, conservando toda a sua feição de esboço, e de um improviso. Hoje O Crime do Padre Amaro aparece em volume — refundido, e transformado. deixou-se parte da velha casa abaixo para erguer a casa nova. Muitos capítulos foram reconstruídos linha por linha; capítulos novos acrescentados, a ação modificada, e desenvolvida; os caracteres mais  estudados, e completados; toda a obra enfim mais trabalhada. Assim O Crime do Padre amaro da Revista Ocidental era um rascunho, a edição provisória; o que hoje se publica e a obra acabada, a edição definitiva. Este trabalho novo conserva todavia — naturalmente — no estilo, no desenho dos personagens, em certos traços da ação e do diálogo, muitos dos defeitos do trabalho antigo: conserva vestígios consideráveis de certas preocupações de Escola e de Partido, — lamentáveis sob o ponto de vista da pura Arte — que tiveram outrora uma influência poderosa no plano original do livro. Mas como estes defeitos provêm da concepção mesma da obra, e do seu desenvolvimento lógico — não podiam ser eliminados, sem que o romance fosse totalmente refeito na ideia e na forma. Todo o mundo compreenderá que — correções, emendas, entrelinhas, folhas intercaladas não bastam para alterar absolutamente a concepção primitiva de um livro, e a sua primitiva execução.»

Eça de Queirós, Akenside Terrace — 5 de julho de 1875

 

Biografia:

Eça de Queirós,  Póvoa de Varzim, 1845 - Neuilly, França, 1900

«José Maria Eça de Queirós é natural da Póvoa do Varzim, estreia-se na Gazeta de Portugal (1866-67) produzindo textos que refletem a imagem de um Eça romântico. Da participação nas atividades do Cenáculo há de nascer a criação conjunta (com Batalha Reis e Antero) do poeta imaginário C. Fradique Mendes. Em parceria com Ramalho Ortigão escreve O mistério da estrada de Sintra, obra em que se cruzam tendências estéticas de extração romântica e decadentista, a par com o entramado do relato policial e a análise de costumes.

A dimensão de crítica social e de intervenção cívica emerge em Eça sobretudo quando das Conferências do Casino (1871) e da publicação d’As farpas (1871-1872), desenrolando-se assim uma atividade orientada para a morigeração dos costumes.

É como cônsul em Newcastle e em Bristol que Eça escreve O primo Basílio (1878) e O crime do padre Amaro (1876 e 1880). Essas estadas no estrangeiro agudizam-lhe a consciência das dificuldades de uma escrita que exigia observação atenta da realidade. Seja como for, O primo Basílio corresponde ao fundamental da doutrinação naturalista, pela representação da atmosfera social que envolve a protagonista e pela lógica implacável de desenvolvimento da intriga de adultério. O crime do padre Amaro, que conheceu três versões, representa já uma fase de maturidade literária no percurso de Eça e uma prova de refinamento naturalista. O protagonista é Amaro, um padre sem vocação, a quem é destinada a paróquia de Leiria, um típico cenário provinciano e beato.

Ainda sob o signo do naturalismo, mas revelando a pervivência da estética romântica, publica Os Maias (1888), romance que ilustra os movimentos e as contradições de uma sociedade historicamente bem carac­terizada. É essa sociedade que motiva em Eça a criação de uma série de personagens-tipo denunciadoras da crise institucional da época.

Nas obras O mandarim (1880) e A relíquia (1887) o mítico e o fantástico, o simbólico e o alegórico combinam-se com a permanente tendência para a crítica de costumes. A relíquia, protagonizada por Teodorico Raposo, revela a convergência dessas orientações. No entanto, a história reveste-se de um pendor acentuadamente crítico e satírico: Teodorico orienta a sua vida de herdeiro da fanática D. Patrocínio, sob o signo da duplicidade.

Nas sua últimas obras, Eça contempla elementos históricos, simbólicos e míticos, já em tempo de mudança ideológica. N’A ilustre casa de Ramires articula a vida monótona de um genuíno fidalgo português, Gonçalo Mendes Ramires, com o episódio histórico relatado na “Torre de D. Ramires”, em que se destaca o antepassado Tructesindo Ramires, exemplo de fidelidade a princípios de lealdade e honra senhorial. Também o romance A cidade e as serras é atravessado por ambiguidades. A existência do Jacinto super-civilizado em Paris, observado por Zé Fernandes, contrapõe-se ao regresso a Portugal; no Douro dos seus antepassa­dos, Jacinto reencontra, entre perplexo e fascinado, uma autenticidade perdida. Deste modo, n’A cidade e as serras testemunham-se fundamentais preocupações emergentes em finais do século XIX, esboçadas já nos contos Civilização e, mais difusamente, n’A perfeição.

Enquanto cultor do romance, Eça de Queirós constitui, na literatura portuguesa, um caso absolutamente invulgar de agilidade técnica e de capacidade de ajustamento da linguagem da narrativa a temas e a motivos que dela careciam. E contudo, Eça não se limitou ao culto do romance; no contexto da sua produção, o conto ocupa um lugar também significativo, não raro em conjugação temática com os romances publicados. Para além disso, Eça cultivou ainda a crónica; desde o Distrito de Évora, pode dizer-se que jamais o escritor abandonou um género que requeria uma contínua atenção ao real, nele se exercitando também a atitude do romancista interessado no contemporâneo. Publicações como a Gazeta de Notícias, A Atualidade, a Revista Moderna e naturalmente a Revista de Portugal foram órgãos privilegiados por uma escrita cronística que propiciou aos leitores portugueses e brasileiros um contacto estreito com a vida cultural, política e social da Europa.»

Carlos Reis in: Dicionário de personagens da ficção portuguesa.


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