Moisés Espírito Santo, A religião popular portuguesa, Regra do Jogo, Lisboa, 1984
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1ª edição.
247 pp.; il.; 23 cm
Pref. de Emile Poulat.
Moisés Espírito Santo, Batalha, 1934
Sociólogo e professor universitário. Com um percurso profissional e académico de tirar o fôlego, chegou à etnologia histórica e à sociologia do sagrado através, muito naturalmente, desse caminho feito.
Estudos liceais; serviço militar cumprido em hospitais militares; animador cultural nas cadeias centrais (1955-1958), após curso ministrado pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, lugar de onde foi despedido por «incompatibilidade com a política do Ministério sobre a organização prisional»; funcionário das Caixas de Previdência (1958-1963), despedido por «incompatibilidade com a política geral do Governo»; refugiado e emigrante em França (1963-1981). Curso de jornalismo no Instituto Francês da Imprensa, do Instituto de Ciências Políticas (Paris), a que não apresentou relatório final. Animador cultural (1966-1977), com formação profissional adequada (dinâmica de grupos, psicologia social, etc.), na Liga Francesa de Ensino e de Educação Permanente, do Ministério francês da Educação, encarregada do sector imigrante.
Autor com Amélia Padez de Le Géant Adamastor et autres Contes du Portugal (1971), livro-álbum sobre Portugal, destinado às escolas secundárias francesas. Formador de animadores culturais para imigrantes em França, com trabalhos no terreno sobre o meio social para informação dos formandos, incluindo estudos no Norte de África, na Mauritânia e no Senegal. Fundador das primeiras associações portuguesas em França – fundou cerca de cinco dezenas de associações de emigrantes e de desertores portugueses e ainda a Liga Portuguesa do Ensino e da Cultura Popular. Professor de Língua Portuguesa no ensino secundário francês (1977-1980).
Entretanto, em 1973, era admitido na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (Paris), na área da Sociologia Rural. Frequentes estudos de campo na zona de Leiria (1973-1976). Diplomado por aquela Escola com o trabalho final La Freguesia / Comune Rurale Portugaise: Vie Communautaire et Conflits (1976), editado em Portugal sob o título de Comunidade Rural ao Norte do Tejo (1980). Matrícula (1976) na Escola de Altos Estudos (Paris) para doutoramento, sob a orientação dos professores Placide Rambaud e Émile Poulat. Diploma de Estudos Aprofundados em Sociologia Rural e Sociologia das Religiões (1977). Doutoramento na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (Paris) com a tese La Religion des Paysans Portugais (1980), editada em Portugal com o título de Religião Popular Portuguesa (1984).
Em 1980 é contratado para a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa como professor auxiliar convidado. Em 1995 faz provas de agregação com a tese O Islão Hoje: Processo de Regressão Datado do Século XII. E, em 1996, é seleccionado no concurso para professor catedrático de Sociologia. Ensina Sociologia Geral, Sociologia Rural, Sociologia Rural e Urbana, Sociologia Rural Aprofundada, Sociologia das Religiões, Sociologia da Cultura e Etno-Sociologia das Sociedades Mediterrânicas. Em todas estas áres dirige cursos de mestrado e pós-graduação e orienta doutoramentos.
Entretanto, começavam a ser publicados em Portugal os seus polémicos livros. Até aí, e como ele próprio escreveu, «Os mestres ditaram, os discípulos repetiram os dizeres dos mestres; as palavras do mestre são verdades de evangelho nunca postas em causa (Deus nos Livre!)». Estudando, no campo, as religiões populares portuguesas, cruzando os resultados desses estudos com a história, incluindo a das religiões – e não só a nossa, oficial, como é evidente –, e também com as tradições vivas ainda noutros países, com os ritos das religiões de que encontra ecos sincréticos entre nós e, também, com estudos linguísticos, nomeadamente através do da toponímia que séculos de censura e ignorância vêm persistindo em roubar do seu real significado, das suas reais origens. Instalou, naturalmente, o pânico. Afinal, a religião popular portuguesa era, «essencialmente, de origem semita-cripto-judaica, proto-cristã e mesmo pré-romana (por via dos fenícios); [...] a língua dos Lusitanos era do ramo cananita (semita, portanto, e não celta, como Leite de Vasconcelos defendeu)» (Fernando Gouveia). E ao mesmo tempo que afirma, herege, que «não só os Lusitanos falavam a língua cananita (fenício), como até centenas de expressões populares de hoje são uma mistura, um crioulo, de cananita e neolatim», Moisés Espírito Santo não toma partido sobre a legitimidade da fé, a veracidade das numerosas aparições, das numerosas Senhoras, constata-as, estuda-as, regista-as, expurga-as apenas do ilegítimo aproveitamento. E quando os «mestres» começavam a sorrir do uso que fazia, em seu parecer empírico, de abonações linguísticas, preparando-se, quiçá, para por aí o minarem, o introdutor em Portugal do estudo sério da sociologia religiosa presenteia os seus críticos com um Dicionário Fenício-Português, Compreendendo as Línguas e Dialectos Falados pelos Fenícios e Cartagineses.
Pois é. Pode ser, e é, polémico. Não foi queimado pela Inquisição, não foi expulso por Pina Manique para os longes de África, nem foi demitido de professor com alguma benção cardinalícia, nem, sequer, preso pela PIDE. Os tempos são outros. Ou são, intervalarmente, outros. Mas há algo que é certo. A etno-sociologia religiosa em Portugal passou a ter um lugar ao sol; a linguística, principalmente a toponímica, não vai ser mais a mesma; e a própria história pátria – e patriótica! – levou um abanão. Não terá razão em tudo o que afirma e defende, mas, doravante, terão de prová-lo usando as mesmas armas – a investigação profunda, a pluridisciplinaridade, o recurso à linguística nas ciências históricas, tudo meios que, como se sabe ou adivinha, dão mesmo muito trabalho.
Continua, por sua iniciativa, a fazer frequentes visitas de estudo a países mediterrânicos, europeus e africanos. Tem colaboração importante em Mediterrâneo e Forum Sociológico, revistas de que é director. Co-fundador da Associação Portuguesa de Sociologia, do Instituto Mediterrânico da Universidade Nova de Lisboa e do Instituto de Sociologia e Etnologia das Religiões da mesma Universidade; membro da Association Internationale de Sociologues de Langue Française (Toulouse), do International Institute of Sociology (Washington) e do International Research Comitte 22 - Sociology of Religion (Roma).
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999